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Ausência do réu no Plenário do Júri: uma opção inteligente?

Até o dia 08 de agosto de 2008, permitia a lei processual penal que somente crimes afiançáveis seriam passíveis de julgamento em plenário sem a presença do réu.

Consoante determinava o artigo 451, em seu parágrafo primeiro, do CPP, “se se tratar de crime afiançável, e o não-comparecimento do réu ocorrer sem motivo legítimo, far-se-á o julgamento à sua revelia”. Já sobre a possibilidade de fiança, o art. 322 do mesmo diploma legal assevera que “a autoridade policial somente poderá conceder fiança nos casos de infração punida com detenção ou prisão simples”.

Coadunando-se os dois dispositivos, percebia-se tratar dos crimes de infanticídio, auto-aborto e aborto consentido, dispostos nos artigos 123 e 124 do Código Penal. Sendo os únicos delitos contra a vida punidos com detenção, somente eles permitiam fiança e, logo, o julgamento sem a presença do acusado.

Entretanto, a partir de 09 de agosto do mesmo ano, quando da entrada em vigor da Lei 11.689, tornou-se opcional a presença do acusado ao longo de seu julgamento em plenário, independentemente do crime capitulado na peça acusatória. Diz o novo art. 457 do CPP que “o julgamento não será adiado pelo não comparecimento do acusado solto, do assistente ou do advogado do querelante, que tiver sido regularmente intimado”.

A mudança, notadamente um corolário da garantia ao silêncio, é salutar, condizente com o estado democrático de direito e coerente com o panorama de seguranças outras que hoje se apresentam pela Constituição Cidadã. Com efeito, se ao acusado se franqueia o silêncio, nada mais justo do que permitir-lhe também a ausência, se assim o desejar.

Interessante salientar que há quem pense que esta facultatividade seja conseqüência do princípio de que não se deve temer por se deter (nemo tenetur se detegere), oriundo do Pacto de San José da Costa Rica. Contudo, apesar de ambos estarem intimamente ligados, a opção pela ausência do réu no Plenário do Júri decorre diretamente do direito ao silêncio, previsto no art. 5º, CF, inciso LXIII.

Recentemente, junto à 1ª Vara do Júri de Porto Alegre, tive oportunidade de defender um acusado ausente da sessão plenária. Sem a prévia entrevista com o réu, lancei minhas teses defensivas a partir do que se consegui captar dos autos. E era pouco, em verdade, porque ao longo de todo o processo o réu comparecera somente perante a autoridade policial, confessando o homicídio em legítima defesa.

Nestes termos, passei a refletir: seria a ausência do réu no Plenário do Júri uma opção inteligente?

Alguns autores até mesmo criticam essa possibilidade de não comparecimento. Isso porque, em se tratando de jurados decidindo de acordo com a sua íntima convicção, com a emoção inerente aos julgamentos de crimes dolosos contra a vida, a ausência do acusado pode refletir uma pessoa buscando eximir-se da responsabilidade. Ademais, após a sistemática imposta pela nova lei processual penal, deslocando-se o interrogatório para a última etapa da instrução, estabeleceu-se, mais do que nunca, seu jaez defensivo – e não apenas probatório. É nesta oportunidade que o réu pode rebater todas as acusações que tem contra si, repassando ao colegiado sentenciante a sua versão dos fatos, o seu tom de voz, o seu olhar, o seu sentimento e a sua alma.

Não entendo por criticável o dispositivo. Em sendo uma opção, por mais desfavorável que ela possa parecer, ainda é uma faculdade, passível de uso, portanto. Ou não.

Certo é que cada advogado tem suas táticas para repassar aos clientes. Alguns crêem oportuno manter-se em silêncio, utilizando-se das prerrogativas constitucionais do direito de calar. Porém, em se tratando do rito do júri e da ausência do réu no plenário do júri, a despeito da novidade, eu tenho as minhas estratégias e delas não abro mão!

Karla Sampaio - Advocacia Criminal Especializada, desde 2005